Jornal Nova Geração

DIA DO HISTORIADOR

Ponte entre o passado e o presente

Conhecer o passado como ferramenta para um futuro melhor. Frase presente no dia a dia de historiadores, por formação ou não. Conheça as pessoas empenhadas em manter viva a memória da formação do Vale do Taquari

Airton Engster hoje é o coordenador do Memorial de Estrela, local que mantém o acervo da Aepan (Foto: Júlia Amaral)

Eram raros os almanaques escritos em alemão na pequena Hulha Negra, distrito de Bagé, nos anos 30. Foi lá que nasceu José Alfredo Schierholt, ouvindo pais, imigrantes alemães, compartilharem percepções sobre achados literários. Essas conversas são algumas das primeiras memórias do professor, e acusam que o interesse por histórias começou ainda na infância.

O livro sobre Hulha Negra, publicado por um tio materno do Schierholt, em 1942, também despertou um novo desejo. No livro, além do anúncio da Nova Colônia, havia uma foto de três crianças, uma delas o pequeno José Alfredo. “Aprendi a gostar de história assim”, conta.

Eram raros os almanaques escritos em alemão na pequena Hulha Negra, distrito de Bagé, nos anos 30. Foi lá que nasceu José Alfredo Schierholt, ouvindo pais, imigrantes alemães, compartilharem percepções sobre achados literários. Essas conversas são algumas das prim

eiras memórias do professor, e acusam que o interesse por histórias começou ainda na infância.

O livro sobre Hulha Negra, publicado por um tio materno do Schierholt, em 1942, também despertou um novo desejo. No livro, além do anúncio da Nova Colônia, havia uma foto de três crianças, uma delas o pequeno José Alfredo. “Aprendi a gostar de história assim”, conta.

Depois da escola, Schierholt entrou para o seminário. O interesse não era no sacerdócio, mas na possibilidade de aprofundar os estudos. Uma das inspirações era o Frei Boaventura Kloppenburg, que fez doutorado em Roma. “Ele achava que eu tinha vocação para ser padre, e eu queria mesmo ser como ele. Mas eu queria estudar”, lembra.

Schierholt chegou a ser ordenado e atuou nas cidades de Santo Ângelo, Rolante e David Canabarro, onde começou a dar aulas. Nesta altura, já era licenciado em filosofia e pensava em largar o sacerdócio. Quando conheceu Rene, deixou a batina e a pequena David Canabarro para morar em Lajeado, onde começou a lecionar no Castelinho.

Qual é o nome dessa praça?

A primeira aula de Schierholt em Lajeado deveria ser sobre os faraós. Assim que entrou na sala, percebeu uma turma dispersa. “Eu disse que sabia porque eles não estavam interessados na aula, e que eles estavam certos. Aí eu perguntei quem sabia o nome da praça que víamos pela janela. Foi um grande silêncio, até que alguém respondeu que era a praça Matriz”, recorda.

Esse foi o método que Schierholt usou para despertar o interesse dos alunos: questionar sobre o que está próximo e faz parte do cotidiano. A partir daquele momento, tanto ele quanto os estudantes passaram a pesquisar sobre a história de Lajeado e região.

Nesse período, ele também começou a atuar como jornalista e por 35 anos trabalhou três turnos nas duas profissões. Schierholt publicou mais de uma dezena de livros sobre a história do Vale do Taquari, desde a formação de municípios como Lajeado, Estrela e Cruzeiro do Sul, até as instituições do Vale, como a Acil.

Legados que incentivam

Uma das obras de Schierholt é o livro “Estrela, Ontem e Hoje”, de 2005. No dia do lançamento, o professor disse que desejava que alguém continuasse com essas pesquisas. João André Mallmann, conhecido como Jam Brasil, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Vale do Taquari, nunca mais esqueceu daquelas palavras.

“Na época eu estava cursando Engenharia de Computação na Univates e já havia trabalhado em uma emissora de rádio e em vários jornais de nossa região. Isto me fez criar o site Nossa Dica”, lembra. O site, que trazia notícias de Estrela e tinha como objetivo dar continuidade ao registro da história, encerrou as atividades no ano passado.

Hoje, Mallmann possui mais de 55 mil imagens do município, fruto do trabalho que começou em 2007. Esse é o maior acervo digital da cidade. Para ele, estudar história a melhor forma de não repetir os erros e construir um futuro melhor.

“Conhecer o passado nos faz ver o sacrifício de muitos dos que nos antecederam e como chegamos até aqui. Nos faz entender porque as coisas que existem hoje estão da forma como estão”, ressalta.

Jam Brasil mantém hoje o maior acervo digital da história de Estrela, com 55 mil fotografias (Foto: Júlia Amaral)

Traduzir para preservar

Na década de 30, um imigrante alemão que morava no Vale viajou dentro de um barril até Juiz de Fora. Essa aventura foi registrada em um diário, preservado pela família como um tesouro, mesmo que mais ninguém falasse alemão e conseguisse ler o que estava escrito.

A família só soube a verdadeira história quando Wolfgang Collischonn se dispôs a traduzir os registros. “Eu dei de presente vários exemplares da tradução. Eles ficaram muito felizes, porque finalmente conseguiram entender a história do bisavô”, lembra Collischonn.

Há anos, a tradução de materiais é o entretenimento do bancário aposentado, filho de imigrantes alemães. Para ele, essa é uma forma de tornar acessível materiais históricos importantes para compreensão do passado e origens da região.

“Alguns gostam de jogar cartas, outros gostam de pescar e outros de lidar com a história. Tem que fazer algo, senão começa a enferrujar”, conta. Entre as publicações originais, estão os livros “Minha querência” e “Arquitetura em Enxaimel”.

Para as traduções, Collischonn tem o cuidado de manter viva a essência das obras. Os dialetos, por exemplo, têm palavras que não seguem as regras gramaticais. Para o livro de anedotas e piadas, manter a originalidade dos termos foi fundamental.

“Aqui eles falam um dialeto que tem piadas, que é muito saboroso. É diferente. São histórias que não se pode escrever numa língua gramatical, porque é a língua do povo. Quando traduz, eu escrevo como eles falam”, diz.

ENTREVISTA – João Paulo da Fontoura,  engenheiro apaixonado por história, é autor do livro “São José de Tebiquary: um Jorro de Luz sobre o Passado do Município de Taquari”, que traz a história do município de 1500 à década de 2010.

“Eu entendo a história como a luz de um lanterna focada no futuro”

A HORA – Quando começou a sua relação com a história?

João Paulo – Eu criei-me numa cidade, São Leopoldo, que tinha, e ainda tem, uma biblioteca enorme e convidativa. Lá, lia-se de tudo livremente. Eu fui rato de biblioteca. Sempre, desde menino li muito e de tudo, nunca menos de cinco livros por mês.

Acho que li todos os romances clássicos da humanidade, inclusive o famoso Ulisses, de James Joyce, do qual resenhei, livro que todos falam mas poucos conseguem passar da página 20. Mas não estudei história. Minha formação é Engenharia Mecânica. Sou um historiador diletante, por paixão.

Quantos itens históricos você mantém em seu acervo? Como livros, revistas e jornais?

João Paulo – Eu tenho uma boa biblioteca em minha casa, com tudo que é tipo de livros, de romances a livros de história. Ultimamente, tenho basicamente investido em comprar livros que registrem a história. Nossa biblioteca pública fica a meros 500 metros da minha casa, portanto essa biblioteca e seu manancial de livros é uma “extensão” da minha.

Sem esnobação, eu leio, hoje, aposentado que sou, para me manter bem informado, em média uns dez livros por mês. Agora neste exato momento estou pesquisando e escrevendo uma biografia do presidente Arthur da Costa e Silva, coisa que me exige ainda mais, mas, sem stress, é prazer!

Para você, qual a importância de preservar a história da região?

João Paulo- Eu entendo a história como a luz de um lanterna focada no futuro. Preservá-la é manter acesa a chama desta lanterna. Eu tenho uma profunda admiração pelos gestores dos municípios do nosso Vale que, mesmo com orçamentos apertados, fazem esforços fiscais para manterem em suas sedes boas bibliotecas e arquivos públicos.

Eu, como cidadão, faço minha parte. Nosso Vale do Taquari tem uma amalgama étnico absolutamente singular: portugueses açorianos, negros, índios, alemães, italianos, poloneses, etc. Somos um Vale com história para legar aos nossos pósteros.

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